quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

Quem manda no coração?

 

 

                                                imagem: shutterstock.com  

Na véspera de S. Valentim, ele confirmou a tranquilidade de um coração leve, de um coração que não anseia, não suspira. E era vê-lo baloiçar numa ausência de sonhos, não imaginando lábios, sorrisos, palavras... 

Ah, mas as coisas fáceis não eram para ele e não sabe se foi obra de Cupido ou de Pã, mas a alegria dela, o seu sentido de humor absolutamente delicioso e certeiro abalaram-lhe a paz do coração vazio!

E lá passou uma noite  sonhar com ela.

E lá se desesperou por sonhá-la tanto! Mas é assim, só os amores impossíveis lhe parecem dignos do seu penar.

terça-feira, 2 de novembro de 2021

Para sempre


 Amanhã, o meu cão querido faz 8 meses.

Não vamos festejar juntos visto que ele não está connosco. Apesar da tristeza de não o ter, o nosso coração agradece termos sentido um amor tamanho. Ele entrou nas nossas vidas e ensinou-nos a dedicação incondicional, a alegria genuína, mas também a necessidade de desapego.

O meu cão querido talvez até seja mais feliz, agora. Talvez até já nem se lembre de nós e já não saiba o nome que lhe demos. Todavia, este será o nosso cão querido para todo o sempre.

segunda-feira, 1 de novembro de 2021

Dia de Todos os Santos

 


Diz que amanhã é que é Dia de Finados. Diz que hoje é, então, o Dia de Todos os Santos.

Felizmente, mãe, nem tu nem eu somos santas... Mas és a minha finada. E, hoje, fui lá oferecer-te umas flores amarelo-limão, sim, que o sol não está para graças e alegra outra paragens. 

Não foi porque é "dia de ir" que fui ao cemitério; fui lá porque sei que ficarias muito triste e a achar que não cuido de ti, no dia em que todas as campas ficam coloridas e cuidadas. Já te ouço a dizer "Era só o que faltava, eu não estar arranjada como as outras!".

Foi o batom e a base que me foi possível dar-te, mãe, a ti que nunca saías sem um aprumo, sem um batonzinho para alegrar.

terça-feira, 19 de outubro de 2021

O escuro em nós


 

O vento ausentou-se e deixou o sol aquecer o mundo, ontem e hoje, há já muito dias.

O sol não se compadece do verde, das gentes, de mim. Ele brilha, independentemente da vontade de homens. 

Os homens, às vezes, são escuros por dentro. No coração e nos olhos. Quando os olhos escurecem, basta chorar; quando é no coração, podem vir rios de lágrimas que o escuro permanece, muito malvado.

Cada um tem as suas escuridões. Cada um tem os seus sois. Procuremo-los em paz.

terça-feira, 24 de agosto de 2021

Parabéns a mim!

 

57 anos!
Ainda ontem estava com os os meus primos, a brincar na casa dos meus avós, ia prá escola de bata branca ou descia as escadas da faculdade e já completei 57 anos!...
Só de imaginar as vezes que já dormi, que já comi, que já respirei...
Já fui tanta coisa, menina, rapariga, aluna, esposa, ... Continuo a ser muitas mais e gosto do que sou, dos valores que defendo, do que admiro, do que decido ou vou decidindo.
O mundo foi mudando e eu também, mas cheguei aqui e estou grata pelo que tenho, pelo que conquistei, pelo que construi.
Venham outros tantos!
Hum!... Talvez não...
Todavia, PARABÉNS A MIM!

terça-feira, 17 de agosto de 2021

Resumo

 


Quase um ano depois da morte da minha mãe, só agora me foi tempo de tocar as suas roupas para as doar.

Nos seus armários, jaziam o que ela comprou, o que ela costurou e o que ela acareou da minha avó e da minha tia-avó, há já tanto desaparecidas. Que a minha mãe era assim, gostava de recordações, tinha gosto em usar o que tinha sido dos seus.

Então, enchi sacos, previamente comprados para esse fim, grandes e negros, como teria de ser, telefonei para a instituição que recolhe doações e, no final, num relance, sem ânimo para contemplações, pensei em como a vida de uma pessoa se resume a uns quantos sacos, grandes e negros, repletos de roupa, à espera de ver a luz do dia noutros corpos, vivos ainda.

terça-feira, 13 de julho de 2021

As Casas

 

Das casas dos meus avós, recordo sempre com o deslumbramento dos olhos da infância, três delas.
Da terra onde morei muito tempo, a casa da avó que permanecerá para todo o sempre é aquela cheia de corredores sinuosos e de recantos escuros, onde me escondia a brincar com as sombras. Sim, com as sombras, já que não tenho irmãos, na altura ainda não tinha primos de mãe e aquela não era casa para levar as amigas. Não interessa, um filho único nunca se aborrece e, com sombras ou não, havia sempre que fazer naquela casa, quer fosse no sótão, no terraço ou entrando de mansinho nos aposentos das minhas tias, locais sempre inalcançáveis e, por isso mesmo, tentadores. Quando os soalhos rangiam com o peso da minha curiosidade, imaginava todos os que por ali teriam andado, certamente mais atarefados do que eu, mas não tão ávidos de aventuras.
Na terra onde nasci, haverá sempre esta casa nos meus sonhos, enorme, de murais já muito desbotados, que já não é nossa, mas que foi a casa da família do meu pai durante largos anos. Foi lá que a minha querida tia-avó Maria me proporcionou os mimos do arroz doce, quente em banho-maria, porque era dele morno que eu gostava e, naquele tempo, o microondas era ficção científica; era lá que me refastelava no cama-pé de palhinha e fingia a minha soberba, em bailes imaginados e repletos de príncipes encantados, como se os houvesse... Foi lá que chorei, quando se decidiu a sua venda, quando percebi que nunca mais poderia passar por baixo do armário embutido para ir da entrada para a cozinha, nem mais podia sentar-me numa cadeirinha à lareira, mesmo dentro da chaminé, a ouvir as histórias que o meu bisavô, já cego, contava.
Na terra onde nasci, sempre que vejo a casa que era dos meus avós em ruínas, sinto a sua mágoa, deles e daquelas paredes que ouviram as gargalhadas das crianças e dos adultos, quando nos juntávamos todos, no verão. Imagino o quintalito, onde o meu avô, que cheirava a abelha, se sentava a preparar os quadros das colmeias, repleto de ervas daninhas e sei que, se eu lá for procurar bem, o meu avô ainda lá está, ou, então, teria ido ao armazém, a porta está aberta e, por isso, é que o não vejo.

domingo, 2 de maio de 2021

Consciência da orfandade

 Sendo este o primeiro Dia da Mãe em que já não tenho mãe, a dor de ser órfã agigantou-se no meu dia...

Sinto a tua falta, mãe!



domingo, 25 de abril de 2021

Somos livres (Uma gaivota voava, voava) - o hino das crianças de Abril


Quando aconteceu o 25 de Abril, eu era uma criança que andava na escola primária. Na altura, não percebi a grandeza nem o alcance da sua existência; recordo, isso sim, esta canção que sabíamos de cor e trauteávamos vezes sem fim na "Choca", o velho autocarro que nos transportava para a escola, todos os dias. 
Fomos felizes a celebrar Abril, assim; somos mais felizes por causa desse Abril, que foi assim para nós, as crianças desse tempo.

domingo, 31 de janeiro de 2021

Here comes the sun

 Vivemos tempos desafiantes e semelhantes aos de uma catástrofe natural. Já morreu muita gente, já não temos connosco familiares, amigos, conhecidos. São muitos milhares de mortos e a desorientação dos vivos não ajuda a mitigar os estragos desta pandemia. Aliadas do medo, temos a revolta, a inquietação e o ser humano está a perder, a uma velocidade estonteante, as características que nos distinguiam dos animais. 

Que vida é esta para os idosos? Eu vejo o meu pai, receoso, fechado e sem conviver com os seus amigos, também eles já idosos, como sempre fez, depois do desgaste de cuidar da minha mãe doente e do desgosto da sua perda.

Que vida é esta para as crianças? Os parques infantis estão interditos; não podem brincar com os amigos, jogar à bola, brigar, abraçar... 

Que vida é esta para os jovens? Época da vida em que se descobre o amor, se integra num grupo, se vai a festas, se faz disparates, se distinguem e interiorizam os valores...

O mundo, como o conhecíamos, não voltará. Pelo menos, enquanto eu viver. 

Mas o planeta cá estará. Connosco ou sem "nosco", com valores diferentes e formas de (sobre)viver diferentes. Se o Homem não conseguir destruí-lo, o mundo continuará a girar sobre si próprio, o sol continuará a nascer e a iluminar o nosso dia.

                                     Imagem Pinterest



quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

Água

 Há já alguns anos, dava apoio a um conjunto de alunos de várias nacionalidades. Havia um chinês, um venezuelano, uma ucraniana e uma moldava, se a memória não me falha. Nos 5 minutos sobrantes da aula, propus que partilhassem algumas palavras nas suas línguas maternas; por exemplo "água". Todos pronunciaram e escreveram no quadro a água dos seus países e, quando chegou a vez do Y. M., o brilhante aluno chinês que sabia mais gramática portuguesa do que os seus colegas portugueses (eu aproveitava para dizer à turma dele que era muito feliz por ter um aluno chinês que soubesse sempre responder às minhas questões de gramática!...), ouço-o perguntar:

- E a "setora" quer saber que "água"? A água da chuva, a água do rio, a água do mar, a água que bebemos, a água que corre... Que água quer, setora?

Nunca mais me esqueci da complexidade do mandarim, nem da grande verdade da inocente pergunta do meu brilhante Y.M....

A "água" é distinta. Sendo vida, ela é, também, frescura, saciedade, tranquilidade, turbulência, brilho, obstáculo... Mas ainda bem!

                                            Foto: Pinterest


   


segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

Relatividade

 É claro que a Humanidade já passou por fases muito mais graves. Certamente que há países em que viver em pandemia se torna mais complicado do que neste nosso retângulo lusitano. Claro que sei que, em Portugal, há milhares de pessoas que enfrentam situações muito mais complicadas e difíceis do que as que estou a viver! Sim, tento sempre ver o copo meio cheio e consigo, quase sempre, vislumbrar a bondade das coisas. Torna-se difícil fazê-lo diariamente, a toda hora e é o que tenho de fazer desde 13 de março de 2020. Hoje, como ontem. Todos os dias. 

  

domingo, 24 de janeiro de 2021

A vida é como as bananas

Para além das notícias diárias agastantes do país, do mundo, em geral, é raro o dia em que não sei de alguém que está doente ou que partiu. E, nestes tempos estranhos e maus, a nossa ansiedade oscila entre o medo e a revolta, presentes no nosso quotidiano, ofuscando a nossa liberdade, o livre arbítrio que nos guiava por entre as veredas da vida.

Agora, a desconfiança e o desagrado oprimem cada uma das nossas decisões, como se isso fosse normal, o tal "novo normal", que mais não é que a anormalidade em que sobrevivemos.

Preocupa-me o mundo em que as minhas filhas viverão; entristece-me esta vida que o meu pai leva, agora, depois de mais de oitenta anos por cá, cheios de genica, de objetivos. Vejo-os perdidos, entristecidos e eu, que sempre cuidei de gente, aflige-me não poder descuidar deles...

E o que mais me dói é a incerteza da próxima hora! Gostava de ir ver o mar...




domingo, 10 de janeiro de 2021

Não, não gosto deste mundo

Há pouco, fui levar a filha mais nova ao autocarro.

Vi 2 pessoas a correr, separadamente, e 2 a caminhar, lado a lado, com máscara. Os carros eram 2 ou 3, numa pressa. Ninguém se assomou à janela.

Depois, depois vi ruas vazias, portas fechadas, grades de lojas corridas. Vi silêncio e vi desalento. Vi a minha cidade no presente e deixei-a escorrer inteira numa lágrima teimosa.

Não gosto deste mundo!

                                             Imagem: Anton Petrus/Getty Images



 

domingo, 3 de janeiro de 2021

2021

 Cá está o novo ano, fresquinho e lavado pela chuva, neste inverno das nossas vidas.

Muita gente tem muita esperança neste ano que acabou de chegar. Eu não.  Não tem a ver com o grau de infelicidade que envolve o mundo e que nos amarra à necessidade de manter a distância, que nos cerceou o toque, que nos impede de ver sorrisos. Sendo certo que as nossas vidas estão diferentes e menos boas, não nos podemos esquecer que a humanidade já passou por muito pior. Nós temos conforto, temos saúde, temos as nossas necessidades básicas asseguradas...

Passei/passámos por desgostos e contratempos que nos sugaram a alma, mas, olhando em volta, temos tanto! Ainda. 

Rejubilemos, pois, e sejamos gratos, não colocando o ónus em ano nenhum, seja ele velho ou novo.