segunda-feira, 27 de abril de 2020

Meia feliz

A minha cocozinha mais nova vai ter de ficar ainda mais um mês a trabalhar em casa. Então, lá lhe disse que se ainda não tinha adoecido depois de 6 semanas fechada em casa do pai, certamente o bicho não tinha querido nada com ela. Que viesse para casa, para o pé de mim, que sou sua mãe e não tenho tido nenhuma filha por perto para implicar. 
Consegui convencê-la e fui buscá-la no sábado.
Agora, já só me afogo em saudades da cria mais velha, que não vejo há 2 meses...
Atingi a meia felicidade, pois então!

quinta-feira, 23 de abril de 2020

Dia Mundial do Livro, o possível

Quando eu era miúda, há muitíssimo tempo atrás, não tinha livros em casa. Os meus pais têm ambos a 4.ª classe e nunca lhes deram valor (apesar de valorizarem o conhecimento...). Então, eu ia buscar livros emprestados a um pólo itinerante da biblioteca da Gulbenkian que existia na minha terra. Comecei a ser freguesa da biblioteca mal aprendi a ler. Aliás, acho que aprendi a ler para poder lá ir requisitar livros...  
Depois, a vida começou a ficar mais desafogada e já nos era possível comprar livros na terra para onde fomos morar, tinha eu 8 anos. Não podíamos comprar muitos, mas os amigos emprestavam uns aos outros (juntamente com os discos, eram uma forma excelente de nos visitarmos - Ó mãe, vou ali a casa da Gina levar este livro que ela me emprestou! Uma vez, zanguei-me com o namorado, deixei-o a falar sozinho e fui para  casa. A desculpa que ele arranjou para me lá ir bater à porta sem que a minha mãe desconfiasse, foi fingir que me ia emprestar uns discos!... Isto foi há mil anos atrás, bem entendido...). 
Também há mil anos atrás, passei a comprar livros em segunda mão, numa barbearia que era dois em um, tratava de barbas e cabelos e vendia-nos os livros a preços simpáticos. Nessa altura, papei de tudo, desde os clássicos aos livros de cowboys e romances de amor!
Não consigo quantificar o número de livros que já li; tampouco consigo imaginar quantos ainda gostaria de ter lido.
Se eu podia viver sem livros? Não, não podia!
Vivam os livros, os escritores e quem os ama!


terça-feira, 21 de abril de 2020

Gosto do som da tua voz



Gosto do som da tua voz 
ao telefone.
É suave,
intenso,
pleno...

Quando conversamos,
ao telefone,
só a tua voz permanece.
Não me distraio
com os teus olhos,
com os teus lábios...

Então,
a tua voz
invade
o meu corpo,
preenche-o,
apazigua-o.

                                                Maio 2006


domingo, 19 de abril de 2020

Tende vergonha, srs políticos!

Parece que há políticos que querem ir comemorar o 25 de Abril, na Assembleia da República. 
Logo lá, na casa da democracia!
Democracia é, também, ter deveres e direitos iguais para todos. 
Gostava de ser testemunha de uma conversa entre estes políticos que defendem esta comemoração e um dos médicos, enfermeiros, assistentes de ação médica que se esfalfam a cuidar de quem precisa, nos nossos hospitais; ou o que diriam à família daquele doente que, estando internado, não pode ter visitas; sim, e às famílias de todos os que já partiram e não puderam despedir-se dos seus entes queridos; também seria interessante escutar as palavras que seriam ditas a quem tem familiares em lares e não pode ir lá visitá-los...
Venham cá a minha casa e consolem-me de já não estar com as minhas filhas há um mês e meio, porque todos temos de fazer a nossa parte para combater esta pandemia...
Tende vergonha! 
O 25 de Abril é muito, muito importante, mas a solidariedade, a comiseração e a generosidade, neste momento em que a Humanidade corre riscos desta envergadura são-no muito mais!
Tende vergonha!

quinta-feira, 16 de abril de 2020

Autoestradas de lágrimas

Há pouco, tentei desbastar as minhas sobrancelhas, não prescindindo do espelho de aumentar e dos óculos, visto que, ao perto, sou tão cega como uma toupeira.
E lá fui levantando uma lente, baixando outra, espernicando, sem querer mas dolorosamente, a pele junto das minhas sobrancelhas farfalhudas, a tal ponto que uma lágrima escorreu pelo canto do meu olho esquerdo. Artilhada de tantos artefactos para aumentar a visão, tive oportunidade de ver o percurso luzidio e harmonioso que a lágrima foi deixando ao passar, no meu rosto. E achei tão bonito!
O pior é quando essa lágrima primordial constrói uma autoestrada por onde descerão muitas e muitas! 

terça-feira, 14 de abril de 2020

Tudo é foi

Uma gota de chuva veio por aí abaixo e deixou-se ficar, muito quietinha, no vão de uma janela. Era uma janela de madeira pintada de verde, que abria para um quintal, onde vivia um grande limoeiro que tinha dois empregos: fazer sombra e perfumar tudo em seu redor. Quando se fechava, a janela agasalhava o quarto pequenino de um menino muito, muito espantado.
Este menino, que se espantava com o voar dos pardais, a azáfama das abelhas, a dança das borboletas e tudo o mais que o seu olhar fisgasse, espantou-se, também, com a pequenina gota de chuva que se fincou na janela pintada de verde.
Com os seus dedinhos curiosos, deu -lhe um piparote e, como a gota de água apenas estremeceu de desdém, decidiu o menino que os seus olhos ávidos e inquietos teriam muito que aprender ali, na sua janela, com esta gotinha de água orgulhosa.
Levantou a sua mãozinha rechonchuda, mirou-a de um lado e do outro, escolheu o dedo indicador - que era aquele que mais lhe servia para ir apontando o mundo à sua frente - e, senhor de si e do seu dedito decidido como ele, carregou com força na gotinha de água, que se desvaneceu na madeira da janela, a tal pintada de verde.
O menino, pasmado, aprendeu, ali, à sua janela de frente para o limoeiro que tudo perfumava, que aquilo que pensamos ser assim, pode, num ápice,  passar a ser assado.

segunda-feira, 13 de abril de 2020

O meu reino por um abraço

Apesar do confinamento, aprendamos a gostar do confinamento.
Teremos dos nos adaptar, reinventar, repensar, transformar, enfim... Ao longo da sua história, o ser humano tem dado provas da sua capacidade de resiliência e acredito que, uns melhor, outros menos bem, vamos conseguir. Assim tenhamos saúde. 
Agora, sinto muito, muito a falta de um abraço!...

domingo, 12 de abril de 2020

Filha n.º 2

És o meu doce!
Menina saltitante,
terna,
de pele veludina...
A tua mão,
sempre estendida,
apertando a minha,
alenta a minha solidão!
De sorriso maroto,
marcas sempre
a diferença,
mostras-me sempre
o caminho,
trazes luz
à minha rotina,
enches de cor
os percursos
que tenho de trilhar...
(16/06/2003)

Filha n.º 1

Foste um raio de luz,
o primeiro
da minha vida.
Perco-me
no mar imenso
dos teus olhos,
na tua timidez
por detrás do sorriso
que assoma
aos teus lábios ternos.
A dureza,
que é carapaça
da tua insegurança,
exaspera-me
faz-me ser intransigente,
por vezes.
Não ligues!
De luta
em luta constante,
sabe-me bem
o ter-te comigo!
É o amor imenso
desta mãe
que é tua...
(16/06/2003)

sábado, 11 de abril de 2020

Comunguemos!

Nem o vento se atrevia a respirar por entre as veredas, por entre as esquinas das casas. O céu vestiu-se de cinzento, embrulhou o sol nas nuvens e mandou-o ficar quietinho, que esperasse melhores dias. Consta que, há mais de dois mil anos atrás, morreu um homem que foi importante para alguns outros homens. Consta que foi condenado à morte injustamente, apenas por ser justo e apreciado por alguns outros homens.Nem toda a humanidade apreciou esta história. Há homens e mulheres, de outros lugares do mundo, onde, se calhar há vento e o sol brilha, que veneram outro homem e outra história. 
Mas isso não quer dizer que a generosidade, a bondade e o perdão tenham cores diferentes. Nestes tempos intranquilos e temerosos, que possamos libertar os dons de humanidade com que todos nascemos. 

quinta-feira, 9 de abril de 2020

Ensino vs Aprendizagem, ou vice-versa. É isto?

Este bicho mau que nos apoquenta há já que tempos e nos confina aos nossos lares não para de nos atormentar.
Já não bastava banir o toque, o beijo, teve de nos condenar ao afastamento do outro (pelo menos um metro, dizem os entendidos!), à estranheza de sermos confrontados connosco próprios a toda a hora e, agora, a nós, professores, à solidão do ensino à distância...
Eu quero lá saber do ensino à distância! Eu gosto é de ver as expressões dos meus alunos, gosto é de poder tocar-lhes nos ombros quando eles estão virados para trás, gosto é de olhar-lhes nos olhos e perceber se eles estão a entender o que estou a dizer ou o que estão a fazer, gosto é de explicar um qualquer conceito 3, 4 ou mais vezes, com gatafunhos no quadro até todos perceberem!...
A relação professor-aluno não se aconchega atrás de um qualquer dispositivo eletrónico!

Quase romance - the end

Perdoou-lhe.
Perdoou-lhe por não a querer, por não ter lutado por ela. Ninguém dá o que não tem e ele não tinha inteligência emocional suficiente para os perceber.
Perdoou-se a si mesma por tê-lo afastado, crendo que ele sentiria a sua falta e não desistiria dela, não desistiria deles, se tivesse realmente havido aquele conjunto (in)finito composto por aquele ele e por ela.
Sabia que pensava nela. No entanto, o seu orgulho e a sua insegurança não lhe permitiam a intrepidez de a chamar de volta.
Assim é a vida. E o sol levantou-se nesses dias todos. Como sempre.


terça-feira, 7 de abril de 2020

Quase romance - 04

O facto de ele não lutar por ela, validou a sua decisão de o querer arrancar de si mesma...

segunda-feira, 6 de abril de 2020

Quase romance - 03

Passados mais de dois meses sem ele, ela gostaria de o pensar menos, recordá-lo menos, acreditar mais que está melhor sem ele, que, afinal, não é o seu companheiro.
Se, vai-se a ver, o tempo ajuda a torná-lo numa memória, também esse malvado vai acrescentado mais e mais saudades...

domingo, 5 de abril de 2020

Receita para um dia de chuva


Tempo para o significado das coisas

Chove. O mundo à luz da chuva é intenso e brilhante.
Quando todos éramos nós e eu tinha de sair de casa, a chuva encanitava-me pelo desconforto de não ter braços nem mãos para as coisas que carregava comigo e só pensava no que não gostava.
Agora, da minha janela, observo os verdes a ficarem mais verdes, os telhados das casas a cumprirem a sua obrigação e tudo retoma o seu significado. 

sexta-feira, 3 de abril de 2020

Quase romance - 02

Tudo tem um fim.
Por vezes, temos a esperança que o fim se atrase, se enrede em hesitações, pequenos nadas que protelem o óbvio. 
Mas não... Quando as prioridades e o grau de investimento são diferentes, alguém de usar o final nesta f(r)ase da vida.
E assim, decidida, certa de que merece mais, de que quer o que ele não lhe consegue dar, arrancou-o de si e fê-lo partir, quem sabe se para chegar a ele próprio...

quinta-feira, 2 de abril de 2020

Quase romance - 01

Lentamente, tudo foi surgindo sem euforias nem expectativas. 
Conversas, por vezes monologais - ela devia fomentar no género masculino a vontade de se ouvir... - idas à praia, com sandes de ovo e melancia aos quadradinhos.
E, assim, de mansinho, ela foi reparando na sua gentileza, nos seus olhos azuis.
Estranhou que ele demorasse um mês inteiro para a beijar, como se os afetos se medissem aos meses. Ela já se teria beijado há que tempos! Mas, depois, percebeu: os lábios abrem portas de desejos inadiáveis, urgentes, pungentes e foi fruindo tudo o que ia acontecendo.

quarta-feira, 1 de abril de 2020

Saídas precárias

A muito custo, contando com a ajuda dos ralhetes das netas que são muito mais válidos que os meus, lá convencemos o meu pai a não ir todos os dias ao pão fresco e  comprar o jornal.
Devido à situação de pandemia que nos atormenta a todos, desde dia 13 de março que assumi as funções de moça de recados.
Ora, hoje, dia de ir à farmácia comprar medicamentos em falta para a mulher doente cá de casa, fui encarregada de vários e distantes "mandados", como se diz lá no meu Alentejo. 
Pela primeira vez, coloquei máscara e luvas para a empreitada e fui, como de costume, à hora do almoço, porque é quando não há filas tão compridas. Tenho sempre muito receio de sair de casa e poder trazer o "bicho mau" para cá, correndo o risco de contaminar os idosos do piso de baixo, pelo que limito as minhas saídas a uma vez por semana.
E lá fui eu, a respirar por detrás da máscara, sentindo-me um Darth Vader ensopado... Ainda por cima, entornava-se água dos céus! Será o universo a querer lavar o mundo deste vírus? Nah, não me parece que consiga; não tinha sabão... O uso da máscara não me fez nada sentir um heróico elemento das equipas dos cuidados de saúde e que, diariamente, arriscam a vida para tratar de quem tem  disso necessidade. Eu era só alguém infeliz e desertinha por terminar as tarefas para poder voltar para casa! 
E gastei horas em filas, porque se é verdade que, à hora de almoço, não há tanta gente a fazer compras, também há menos funcionários nos locais, visto que eles também têm de almoçar!
Até nisto deixámos de ter qualidade de vida...