sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Conversas, gestos, cheiros - III

A minha avó materna viveu muitos anos numa casa enorme, no centro da localidade, por cima de uma retrosaria. Era tão imensa a casa que eu me deliciava a jogar às escondidas por todos os recantos e pelas suas oito assoalhadas. Tinha também um sótão muito acolhedor, com tês divisões pequeninas e um terraço soalheiro e com uma vista soberba, sobre a avenida. Havia um quarto sem janelas, onde eu dormia, quando lá passava temporadas, que não me agradava muito, porque era mesmo lá ao fundo do corredor e eu sentia-me abandonada, naquela casa cheia de ruídos e já muito antiga. Mas adorava esconder-me no imenso roupeiro, que ocupava uma só divisão e fingir que não ouvia quando me chamavam para tomar as refeições. Quando as minhas tias lá não estavam, deambulava pelos seus quartos e fazia questão de me assomar a todas as janelas, mirando sempre novas coisas, porque a casa dava para três ruas distintas. Quando a minha avó foi morar para uma casa num bairro periférico e para um andar de umas banais quatro assoalhadas, num prédio de muitos pisos, percebi que aquele mundo da minha infância tinha ficado naquela casa de soalho de madeira e divisões de muitas janelas, para várias ruas…

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